Tá surdo?!?
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Você está ouvindo pouco? Seu sono é agitado? Anda irritado com as pessoas, o cachorro e a patroa? Não quer saber de sexo? As palavras que você mais usa são “fala mais alto”, “hein?” e “não entendi nada, repete”? Está se sentido deprimido, cansado, com dores de cabeça, zumbido nos ouvidos. sem apetite? Nem tudo está perdido, meu amigo, acho que tenho uma boa notícia para você.
Seu problema é provocado pela poluição sonora urbana, aqueles barulhos cotidianos irritantes como serra elétrica em obras, aceleradas de motocicletas, automóveis com descarga aberta e som mais potente que baile funk nas comunidades, carga e descarga de caçambas de entulhos a qualquer hora do dia (e da noite), montagem de feiras livres de madrugada, torcidas organizadas, aos berros, assistindo jogos de futebol nos bares com TV (todos, né?), pessoas gritando no celular, som alto na casa do vizinho e, para quem morou na Urca, a aproximação de aviões para aterrissar no porta-aviões, perdão, aeroporto Santos Dumont, com as turbinas rugindo com força e você rezando para o bicho não cair dentro de sua sala.
Ninguém merece, não é mesmo? Infelizmente, tenho também uma má notícia: a cura dessa doença é complicada, talvez impossível, principalmente se você mora numa cidade entregue às baratas com quase dez milhões de vizinhos. Mas tem remédio, claro. Reclame, cobre das autoridades municipais, estaduais e federais, acione o BOPE, denuncie à ONU. Aliás, dar queixa ao Papa ajuda muito. O problema é que… Bom, como todo mundo no Rio acredita que tem todos os direitos e nenhum dever, uns dois dias depois a zona volta a se restabelecer.
Um pesadelo, não é mesmo?
Um belo dia juntei as poluições sonora e ambiental com a óbvia insegurança, decadência econômica, favelização descontrolada, falência da administração pública e resolvi ir embora da cidade onde nasci, cresci e morei exatos 67 anos. Estava me sentindo infeliz, surdo, estressado, sem perspectiva alguma, com medo de levar um tiro e, para piorar, numa cidade muito cara.
Juntei meu povo e fomos embora para a serra, continuar nossa jornada numa cidade com menos de 2% da população do Rio, ainda segura, calma e ordenada, onde você conhece seus vizinhos, não tem medo da polícia ou ser “premiado” com uma bala perdida e pode dormir a noite toda, tranquilo como um bebê.
Enfim, esse texto todo é para defender que o melhor remédio contra a poluição sonora urbana (e todas as outras) é morar no interior. Tô falando sério! Não dá nem para explicar, só o fato de perceber que você não tem milhões de vizinhos já é um alívio enorme. Não seja preconceituoso, meu caro leitor, experimente. Vai que você gosta?
(2019)
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